quarta-feira, 9 de maio de 2012

A REVISÃO DO CÓDIGO CIMI / AVALIAÇÃO EM MASSA

A propósito do artigo publicado abaixo e porque o CIMI é um assunto hoje na ordem do dia, republicamos aqui a nossa opinião publicada no jornal  "Sol", em 16.09.2011 e conforme opinião, já anteriomente  transmitida e partilhada  em Assembleia Geral da APAE.

"O Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), em vigor desde 2003, com ajustado propósito e por profunda desadequação, substituiu o velho Código da Contribuição Predial e Imposto sobre a Indústria Agrícola de 1963. Este novo código foi comummente aceite, num tempo não muito distante de enorme valorização nominal dos imóveis, em especial dos prédios urbanos habitacionais, comerciais e terrenos para construção, por contraponto com uma economia rural em degradação e onde até então, a riqueza imobiliária era predominantemente rústica.

O novo código e os seus agentes, apesar de algumas vezes confrontados com a inadequação dos seus resultados, têm feito o seu caminho sem atender a divergências algumas vezes publicamente expressas. Por certo pelo facto de o novo código, ter surgido justamente no culminar duma época de grande transformação do valor imobiliário e da generalizada percepção pública desse fenómeno. Volvidos dez anos de reconhecida crise no sector da indústria de construção civil, sendo hoje nítido existir uma oferta muito excedentária á procura, o mercado também revela uma forte dinâmica de degradação do valor comercial da habitação.

Em consequência, aumenta a contestação relativamente ao método de cálculo da avaliação consagrado no código CIMI. Caso há de autarquias que mobilizam os seus próprios serviços no sentido de inventariar a realidade do mercado local e com ele confrontar os serviços da Direcção Geral de Contribuições e Impostos, na tentativa de obterem acolhimento como intérpretes das muitas reclamações de que são depositários os serviços de finanças locais e os respectivos serviços das autarquias, dado que de um imposto municipal se trata.

O método de cálculo consagrado pelo CIMI, tem uma única variável dinâmica, que é o presumido custo médio por metro quadrado de construção, sendo os restantes componentes da fórmula, factores que traduzem a dimensão e a conservação do imóvel. O cálculo é definitivamente influenciado pelo invariante associado ao valor da localização relativa. Como os factores mensuram grandezas físicas incontornáveis e o valor da localização relativa uma vez “bem” estabelecido, não tem como ser alterado, resta “mexer” no valor do custo do metro quadrado de construção, admitindo-se que possa diminuir, como no ano transacto, o que é inverosímil. Esta necessidade de “simular” um custo de construção no futuro, com um valor absoluto mais baixo que o de anos transactos, evidencia bem a fragilidade do método e a intrínseca incapacidade do mesmo acompanhar a dinâmica do mercado. Desprezou-se a lei da oferta e da procura, característica mais básica de uma economia de mercado.

O carácter dúbio das directrizes relativas à apreciação da qualidade construtiva, da localização excepcional e do estado de conservação, associado à debilidade da definição destes conceitos constantes na Portaria nº 1427/2004, e a inexistência de um descritor de valor para eles, na prática leva facilmente à diferenciação patrimonial de imóveis semelhantes. Nas áreas-limite dos zonamentos, quase sempre coincidentes com arruamentos, os índices de localização operam a promoção de um dos lados e a desvalorização do outro, sem que se preveja no método nenhum processo correctivo para as desigualdades que fomenta. Constata-se ainda uma completa incapacidade do método de processos de diferenciação do valor patrimonial, de diferentes fracções dentro do mesmo prédio e face, por exemplo, à orientação, como à exposição, ou dimensão panorâmica.

Face à amplitude do erro detectado, 66,34% em 85% do valor de mercado associado ao emprego da metodologia CIMI, e atendendo à legislação que a suporta, se nos casos em que tal erro ocorra por defeito, se pode aceitar isso na defesa dos contribuintes, já nos casos em que tal ocorre por excesso, porquanto isso tem de injusto, – ter um património contributivo valorizado pelo Estado em níveis que o próprio mercado não confirma, -- talvez devesse nesses casos, após revisão estar assegurado ao contribuinte o direito de defesa e demonstração do erro, ou a resolução comercial com o Estado, dado que de um bem de equipamento social se trata. O Decreto-Lei n.º 287/2003, nesta situação, sem a consagração do direito de contestação com prova diversa ou extra-regulamentar ao CIMI, é fortemente penalizante para uma indústria que ciclicamente ocorre numa produção excedentária bem como para utentes e proprietários finais.

Situação que se tem verificado de forma cada vez mais incidente, em todo o território nacional, nos últimos anos, penalizando seriamente industriais e proprietários, favorecendo colectas tributárias inadequadas e injustas. O Decreto-Lei n.º 287/2003 na sua extensão confere à Metodologia CIMI um estatuto de rigor quase científico (porque regulamentarmente incontestável), carácter que claramente não tem, e importa em nossa opinião, denunciar e corrigir tal presunção.
Por outro lado, o Decreto-Lei n.º 287/2003, identifica a necessidade de reavaliação de todo parque habitacional nacional, por forma a equalizar o tratamento tributário entre todas as matrizes prediais urbanas, novas e antigas, ( estimam-se em cerca de milhões os prédios nunca avaliados) por forma a quiçá com uma maior universalidade na aplicação do imposto, e consequente aumento das receitas, se possa como é expectável e desejável, vir a reduzir o valor da taxa incidente. Processo que será sempre muito lento e difícil de realizar sem uma forte mobilização de meios humanos e técnicos.

Do conhecimento que obtivemos enquanto investigávamos para a tese de Mestrado “ O CIMI FACE À INFERÊNCIA ESTATÍSTICA”, (FCTUC, 2005) propusemo-nos, em boa hora continuar esse trabalho, em tese de Doutoramento com um ensaio sobre “ AVALIAÇÃO IMOBILIÁRIA EM MASSA – DETERMINAÇÃO DO VALOR DA LOCALIZAÇÃO” , (FCTUC, 2011) que agora concluímos.

Tomámos a área geográfica de uma dessas autarquias portuguesas atrás referidas, como um caso de estudo e ensaio de metodologias científicas de avaliação imobiliária e tentámos demonstrar a oportunidade e acerto de um método que leve em conta o processo de evolução das cidades e do mercado imobiliário, valorização e desvalorização do mesmo.

Entre todas as variáveis que influenciam no valor dos imóveis, as variáveis ou factores referentes à localização dos mesmos são as mais complexas de analisar e modelar. A multiplicidade de factores ambientais, sociais e económicos que influenciam o valor dos imóveis numa determinada região é difícil de ser modelada adequadamente pelos métodos inferenciais tradicionais, provocando problemas de especificação nos modelos e autocorrelação espacial nos resíduos, comprometendo a confiabilidade da avaliação. Os modelos de estatística espacial, em especial os de regressão espacial e os métodos geoestatísticos são usados neste trabalho de forma combinada para estimar o valor dos imóveis e da respectiva localização. Uma aplicação do método foi realizada para uma amostra de mercado de toda a área urbana da Vila de Nazaré, Distrito de Leiria, Portugal. O método proposto permitiu encontrar um índice do valor da localização dos imóveis que se mostra fortemente significativo no modelo de regressão, simultaneamente para todos os tipos de imóveis da vila considerados em simultâneo, terrenos, moradias, apartamentos e comércios e que modela de forma coerente e consistente o efeito do conjunto de pólos de valorização presentes na vila. O resultado mostrou que é possível realizar avaliações em massa por métodos inferenciais com estimativas confiáveis e consistentes para todos os tipos de imóveis em simultâneo, inclusive para aqueles tipos que se encontram em número limitado ou muito dispersos numa determinada região, a partir de um número reduzido de variáveis, mas onde o conhecimento prévio do valor da localização é fundamental.

Apesar da importância, por muitos reconhecida, da necessidade de contar com Plantas de Valores Genéricos (PVG), a sua implementação prática tem apresentado importantes dificuldades técnicas, principalmente devido a problemas de metodologia aplicada, de disponibilidade de informações actualizadas e de acesso e domínio de ferramentas de análise e modelagem apropriadas. Vários agentes sociais e económicos, estão portanto, interessados em conhecer o correcto valor de mercado dos imóveis de uma região, os métodos usados e suas garantias de acerto, equidade e justiça, mantendo actualizada essa informação. Entre esses agentes as administrações municipais, mais do que interesse, terão sem exagero, essa responsabilidade.

O método proposto permite a elaboração de uma planta de valores genéricos para a localização na área de estudo e para todos os tipos de imóveis incluídos na amostra de mercado. O modelo apresentou um ajuste adequado para todos os tipos de imóveis e para toda a área considerada, como mostrou a análise de performance da avaliação em massa. O método pode ser aplicado para estudar de forma sistemática e permanente o dinamismo de valorização e desvalorização imobiliária de uma região. A pesquisa permanente de dados de mercado permitirá aumentar a abrangência espacial dos dados, melhorando as estimativas dos factores de homogeneização e do valor de localização, permitindo analisar a evolução dos pólos de valorização. O método proposto poderá assim ser de grande utilidade para serviços de finanças e órgãos municipais responsáveis pelo cálculo e actualização do valor genérico dos imóveis e permitirá analisar a valorização imobiliária causada por obras públicas, avaliando a área efectiva de influência e o índice de valorização num período determinado para o cálculo e cobrança de IMI e IMT.

O método mostra a importância de contar com dados cadastrais georreferenciados e actualizados. A implementação de Sistemas de Informações Geográficas (SIG) nas Câmaras Municipais, já por muitos adoptado, pode facilitar o desenvolvimento e a aplicação do método na elaboração de Plantas de Valores Genéricos actualizadas de prédios urbanos e terrenos e em concordância com valores de mercado. Além disso, a maioria dos softwares de SIG contém módulos de análise geoestatística incorporados, facilitando a aplicação deste método. O método permite a avaliação de Imóveis em Massa, para efeitos de tributação municipal e supramunicipal, com um reduzido envolvimento de meios técnicos e humanos, com previsível inserção e desenvolvimento em modelos de planeamento e gestão territorial em sistemas SIG- Sistemas de Informação Geográfica.

Em Portugal a profissão está completamente desregulada, há duas associações profissionais, a APAE e mais recentemente a ANA, sem quaisquer sinais de convergência entre ambas e ambas são de representatividade escassa e duvidosa, face ao universo de profissionais. Neste cenário a CMVM parece ter-se outorgado a si própria a capacidade de estabelecer as condições de registo e acesso desses profissionais há avaliação de imóveis de fundos imobiliários, estabelecendo mínimos para isso. Ao nível da avaliação patrimonial fiscal, o cenário é idêntico, embora nada convergente, aí o código CIMI é “a bíblia” e nada mais parece importar. A normalização da avaliação imobiliária em Portugal, de metodologias e de profissionais, tendo subjacente a normalização europeia na adopção de métodos estatísticos, agora recomendados ao Estado Português, em resultado do acordo de financiamento pelo BCE e FMI, será uma oportunidade do Governo Nacional para a criação de um novo conjunto normativo moderno para o nosso País, que nos aproxime do estado da arte em uso em comunidades técnica e cientificamente mais desenvolvidas, seja no mundo anglo-saxónico seja até mesmo no Brasil, país  lusófono com um regime de avaliação fiscal sobre património bem conhecido entre nós, reconhecido e respeitado como eficiente, também ele apoiado na análise estatística de mercado. "

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